Escrever, pra mim

Eu não passo de uma garota qualquer. Não vivi em catástrofes, não senti terremotos, não estive na guerra e os apertos que passei não passaram de corridas da diretora no corredor da escola. Sendo assim, qualquer, sou esquecida por muitos, amada por alguns, entendida por pouquíssimos, se não por apenas um. Eu tenho minhas singularidades, o que não faz de mim especial, mas apenas ser humano.

Nem sempre vou contar histórias fantásticas de reis, leões e reinos distantes, esquecidos na infância de muitos, perpetuados na memória de alguns. Não que não sonhe, pelo contrário, sonho demais. Quantos reinos não criei nessa mente dispersa? Quantos vezes não cheguei perto do sol? E quantas vezes não pude jurar que me afogava até o núcleo da terra dentro dos meus lençóis?

Não tenho nada de mais para oferecer, ao mesmo tempo tenho tudo. Vivo na tentativa constante de fazer das palavras minha ponte, um caminho até o mundo, meu grito, meu uivo. Queria ver com olhos de outro, por um segundo apenas, ver as cores, os sons e os cheiros. Ver a tarde ofusca e quente, engordurada de gente e ônibus. A noite clara infestada de grandes vaga-lumes, parados, no mesmo lugar. Queria estar onde não posso estar. Na verdade, eu posso tudo. Eu posso estar aqui e estar lá, mas isso, só no meu mundo.

E nessa angústia sem fim eu procuro minha história, jovem e inocente. Quero vê-la subir ao ar num suspiro breve e apaixonado que a gente dá quando lembra do primeiro beijo dado as escondidas em uma das esquinas da sala, durante o intervalo, em uma roda de risos. Esse mesmo suspiro quero dar quando vê-la esboçada nas minhas mãos, virando a última página, sorrindo. Sempre vai haver algo para mudar ali ou aqui, mas eu vou apenas sorrir. Sorrir e suspirar.

A primeira vez que quis escrever foi como o primeiro banho de chuva, eu acho. Não que eu me lembre do meu primeiro banho. Não me lembro. Acredito que deve ser a mesma situação. Você sente o cheiro de chuva e uma lambida do vento nas pernas. O corpo estremece. O céu ronca, encinzece. A primeira gota cai gentil no seu ombro, instintivamente você olha para o alto. O temor cresce misturado a uma excitação. Mais gostas, mais cheiro, mais chuva. E pronto! Você acaba de ser enfeitiçado. Se deleita no gentil prazer de um banho de chuva e descobre nele uma liberdade inconstante. Uma coisa estranha, que coça dentro da gente.
Escrever é assim.

(Clarice Cerqueira - 30/05/2008)

Comentários

  1. Ficou absolutamente sensacional! Me apaixonei pelo texto! Parabéns paixao!

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  2. cla, sua lyda, quem é esse q te entende? fiquei curiosos. vc escreve genialmente, mas falta achar um tema q desperte mais interesse. tipo esse post, eu li até o final pq falava de vc, e eu me interesso por vc, mas uns outros q falavam de umas coisas randoom, eu vi q tava bem escrito, mas num tive paciência de ler, pq naum gosto tanto de literatura, então num é qualquer coisa q prende minha atenção. ñ sei q público vc quer atingir, mas se for uma mais amplo, pense nisso: o q te move, o q vc tem vergonha de dizer, o q vc teria vergonha de ler (e eu num tô falando de coisas sexuais naum, a pesar de q são umas das inúmeras possibilidades), como vc é capaz de chocar? fikdik. te amo!

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  3. hahahaha... van, seu maluco.
    obrigada pela sugestão. Vou pensar mais no assunto sim. Aqui não tenho assunto predefinido porque aqui falo de mim, falo de tudo, de qualquer coisa, só por escrever. Mas a longo prazo o que quero mesmo é escrever para pessoas que gostem de ficção, mais específico romance e aventura.
    Muito interessante a questão da vergonha... realmente é gostoso ver alguém dizendo o que você queria dizer mas não disse. É admirável. Mas acho que meu ramo é mais ficção mesmo, e romance como disse.
    Bom... depois nós conversamos.
    Beijucos... tbm te amo!

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  4. Clarice!!!! Menina, que lindo o que vc escreve!
    Não sabia deste teu talento... Eu adoro ler e escrever, mas no momento to em alguns romances que comecei e tenho que terminar... Tempo é ouro realmente!
    Adorei!
    Depois trocamos idéias... Bjs.

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  5. Ei Poli!
    Obrigada! Adoraria trocar idéias!
    É sempre bom encontrar alguém que goste de ler e escrever também!
    um abração!

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